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Canal Acontece nos Livros - Whisner Fraga.
Milton,
fale um pouco sobre o seu processo criativo.
Meu projeto literário, enquanto planejamento, pode-se dizer que iniciou com a
publicação do meu primeiro livro O Acaso das Manhãs (1986). Comecei a
escrever aos 13 anos de idade, mas eram esboços, etapas de um aprendizado. Eu
enchia cadernos e mais cadernos com manuscritos e depois várias pastas
datilografadas, mas aos 20 anos queimei todos eles, pois achava que já era hora
de encarar a literatura mais a sério.
Entretanto,
de vez em quando, retornam à minha memória alguns daqueles versos e eu sinto
nostalgia daquela espontaneidade que o tempo fez questão de sepultar. Eu lia
muito por esta época, mais do que eu leio atualmente e meus autores preferidos
foram se consolidando até chegar a esta tríade que me acompanha até hoje:
Drummond, Fernando Pessoa e Augusto dos Anjos.
Mas
há outros, não menos importantes, como o Bandeira, o Graciliano Ramos, Edgar
Alan Poe, H.P. Lovecraft, entre tantos.
Eu
reviso muitas vezes os meus escritos, acho isso fundamental, principalmente
para autores que, como eu, não submete os seus textos a
ninguém antes de serem publicados. portanto eles não devem ter palavras
faltando nem sobrando e esta é a minha única medida. Mas mesmo assim é preciso
esperar algum tempo pela decantação do texto porque “a literatura é a emoção
recolhida em tranquilidade”, no dizer do autor inglês W. Wordsworth.
E
entendo a literatura como registros, retratos de si, pistas que deixamos como pegadas na areia de
uma posteridade que, provavelmente, ninguém irá notar.
Quanto
a linguagem eu prefiro uma que seja enxuta, direta, sem rodeios. “sua forma de escrever é ácida, sem
concessões. seus poemas são mordazes, incrivelmente corajosos. ele nunca poupa
a si mesmo nem ao mundo. Milton vem da melhor tradição da poesia e prossegue
com ela” (M.S).
os
meus temas predominantes são a solidão, o amor e a morte. Tudo o que foi retido
no território bruto e confuso da memória, reminiscências, revolta e um pouco de
ternura.
Minhas
preferências são várias, mas de um modo específico, muitas delas giram em torno
da morte, dos cemitérios, figuras estranhas e insólitas permeadas por um fator
sobrenatural e um fator filosófico. Como de resto em toda a minha poética,
esses fatores.
Em
2013 foi defendida e aprovada pela Universidade Federal de Juiz de Fora e
depois, já em 2015, publicada em livro a dissertação de mestrado de Maria José
Rezende Campos intitulada “Tempo de poesia: intertextualidade, heteronímia e
inventário poético em Milton Rezende”, constituindo assim na primeira
publicação a tratar da fortuna crítica do autor.
Finalmente
eu tenho ainda mais alguns, poucos, projetos literários na cabeça, pelo menos
em esboço que espero concluir. De qualquer forma pretendo chegar a um ponto
onde eu possa pelo menos suster o meu processo criativo e dar por encerrada a
minha atividade literária. Talvez mais uns quatro volumes e já estará de bom
tamanho. Ainda nesse ano de 2022 sairá o meu livro ANÍMICA (no prelo) e
depois, quem sabe conseguir publicar a minha Antologia Poética. Feito
isso ficarão faltando, eu acho, mais dois livros para encerrar. Ciao!
Gênese:
neste texto eu digo “autores que, como eu, não submete os seus
textos a ninguém antes de serem publicados.”
isso,
no meu caso, é mesmo verdade, exceção feita a “Mais uma xícara de café”.
A composição e a escrita deste livro foi algo sui generis que, em mim, não vai
se repetir. Mesmo porque, por problemas de saúde, hoje eu já não bebo e tudo o
que escrevo é “a frio”.
Escrevi “Mais uma xícara de café”, como digo
no próprio decorrer do livro, basicamente sob os efeitos do álcool no
organismo. Numa espécie de escrita que obedecia unicamente ao fluxo da
consciência ou da sua inconsciência. Eu pretendia colocar em prática uma
espécie de “escrita automática”, algo assim como abrir “As Portas Percepção”. Pois
bem, fiz isso em geral no livro todo, mas é claro que no dia seguinte, sóbrio,
eu relia todo o trecho e fazia meus apontamentos, correções, revisões e mesmo
supressões ou alterações no texto escrito na noite anterior. Mas mantendo a sua
essência, o seu fluxo e ritmo próprios.
Naturalmente,
depois do original pronto, eu estava confuso e inseguro quanto ao resultado
final. Se teria qualidades a ponto de eu decidir publicá-lo.
Assim
sendo, pela primeira e única vez eu resolvi submetê-lo à opinião alheia na
pessoa do poeta e escritor conterrâneo Marcelo Serodre, então meu amigo e a
quem eu prezava sobremaneira a sua opinião literária. Não sem razão.
Então
ele, após a leitura, escreveu-me um e-mail desancando o meu original,
apontando-lhes inúmeros defeitos. Foi como um balde de água fria. Mas como eu
respeitava seus conceitos e opiniões tive que agradecer-lhe pela leitura e os
“palpites” que dera. Alguns eu achara pertinentes e outros nem tanto. Isso foi alguns
anos antes de 2006/2007, quando da sua redação final e definitiva.
Coloquei
os originais na gaveta para decantação e amadurecimento em mim. Lendo-o e
relendo-o várias e repetidas vezes eu lhe achava qualidades apesar dos muitos
defeitos. Resolvi então colocar as mãos na massa e modificar e reescrever
alguns trechos ou passagens. Fiz um trabalho consciente e meticuloso e
considerei-o “quase pronto” e acabado. E quando eu considero alguns dos meus
livros prontos e acabados eu não mexo mais neles e essa segunda versão eu
submeti à apreciação do grande poeta e tradutor Ivo Barroso, meu amigo e também
conterrâneo de Ervália, Minas Gerais.
Dessa
sua leitura e apreciação ainda surgiram pequenos ajustes aqui e acolá que eu
fiz, mandando-o para a editora e ser, finalmente, publicado. Isso já era o ano
de 2017. Portanto um longo percurso e espera que valeram a pena, pois foi muito
bem recebido a ponto de o consagrado Ivo Barroso chama-lo de “livrão”. Assim o “Mais
uma xícara de café” finalmente veio a lume.
www.miltoncarlosrezende.com.br
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