Prezada
Lica Campolin,
Não
farei uma resenha do seu livro porque resenhas geralmente se aplicam a livros
de literatura, ficção e o seu livro é um relato, um depoimento pessoal e
contundente sobre uma situação dolorosa que você viveu juntamente com o seu
filho Júlio que, infelizmente, veio a falecer. Mas é também uma história de
vivência e de aprendizado.
O
seu livro inicialmente me convidou à leitura devido ao título que achei
instigante. Depois reparei e gostei da capa, ainda não sabendo do que se tratava
e o que representava. Mas logo você explica que são nomes de alguns doadores de
sangue e de medula óssea que fizeram para o seu filho. Então lembrei-me das
dezoito transfusões de sangue que tiveram que fazer em mim enquanto eu estive
internado e inconsciente no c.t.i por 90 dias.
“primeiro
a gente põe o pé,
depois Deus coloca o chão”
Gostei
mais da segunda parte do livro, ou seja, suas reflexões depois da morte do
Júlio. Foi, sem dúvida, a melhor parte embora se referisse, na verdade, à pior
parte vivida por você, ou seja, a ausência do seu amado filho.
Então,
conforme seu convite na contracapa, pulemos juntos neste abismo. Só depois, bem
depois é que reparei que aqueles nomes na capa formavam um esboço do rosto do
Júlio Campolin. Na verdade, todos nós somos apenas um esboço e não passamos
disso e “Deus não é mesmo suficiente”.
Que
não se procure no seu livro muita literatura e nem foi esse o seu propósito ao
escrevê-lo. Simplesmente teve que escrever para tentar expurgar a dor. Mas há
momentos literários no livro como na página 153, um verdadeiro poema.
Vou
abrir aqui um parêntesis para explicar o que eu disse anteriormente e o faço
com o propósito de compartilhar o que vivenciamos e que, de uma certa forma, se
assemelham. Você faz explicitamente um louvor e um agradecimento à equipe
médica que cuidou do seu filho, especialmente a um médico em particular. Não
tive a mesma sorte.
Em
2016 tive que fazer uma cirurgia aparentemente simples que, por imperícia
médica, se complicou e quase perdi a vida, embora persistem e irão persistir
pelo resto dos meus dias as sequelas de um derrame cerebral que
eufemisticamente chamam de a.v.c. Prefiro a forma antiga quando se denominavam
as coisas pelo que elas realmente eram.
Enfim,
tive este episódio dentro do próprio c.t.i, num hospital em que entrei para
fazer uma simples cirurgia por vídeo e disseram-me que dentro de três dias eu
teria alta e depois de quinze dias poderia voltar ao trabalho e à vida normal. Acabei
ficando 90 dias entre a vida e a morte, em coma, e estou hoje aposentado por
invalidez permanente e irreversível.
Mas
como se diz por aí “vida que segue”. Só abri este parêntesis para dizer que eu,
estando inconsciente, minha esposa, que estava o tempo todo atuante e ativa vivenciou
mais ou menos, ou seja, de uma forma semelhante tudo que você narra em seu
livro. Com a diferença de que eu, ao contrário do seu filho, acabei pendendo
para o lado da continuidade da vida e até mesmo os próprios médicos dizem não
entender como eu pude sobreviver. Mistérios e muitos dizem que deve haver nisso
algum propósito que eu não sei qual seja e nem sequer consigo alcançar. Como no
seu livro Lica, são perguntas e perguntas e muitas questões para as quais eu
acho e acredito que nunca obteremos respostas.
Mas
afinal, apesar das dificuldades e das dores que eu sinto, ainda agradeço, pois,
o meu cognitivo não foi afetado, como comumente acontece nesses casos, e
prossigo escrevendo e publicando os meus livros até a hora fatal e derradeira.
A
página 193 do seu livro é maravilhosa e transcrevo-a aqui, desejando que sirva
sobretudo para você e para todos aqueles que sofrem. Espero e desejo
sinceramente que você possa suplantar como no capítulo final de “Quando Deus
não é suficiente”.
...ӈs
vezes, o coração rasgado pela dor, vira retalho.
recomenda-se
nesse caso,
costurá-lo
com uma linha chamada recomeço
é
o suficiente”...
(A.
Santos)
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