Por Patrick Ariel
Adquiri
num evento de uniersidde o livro recém-lançado sobre o poeta Milton Rezende. Praticamente
passou despercebido tanto o autor quanto os seus poemas e essa dissertação resgata
esse lapso inconcebível e inicia a fortuna crítica do autor mineiro.
Trata-se
do livro “Tempo de Poesia: Intertextualidade, Heteronímia e Inventário Poético
em Milton Rezende”, da autora Maria José Rezende Campos, publicado através da
Editora Penalux (2015).
O
livro já nos pega pela capa que, segundo a autora, é a representação gráfica de
um dos poemas do Milton: Obstáculos. Na
contracapa, em meio às gotas de chuva do desenho, um comentário do consagrado
Ivo Barroso, tradutor de Hesse, Rimbaud, entre tantos outros.
As
orelhas trazem a apreciação do Prof. Luiz Fernando Medeiros de Carvalho,
orientador da autora no mestrado em letras que resultou na presente publicação.
O prefácio foi escrito por Anderson Pires da Silva e a apresentação traz a rubrica
de Nícea Helena Nogueira, ambos conceituados professores da Universidade
Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Por
esse arcabouço já se pode perceber a excelência da presente e oportuna
publicação acadêmica que, no entanto, nos prende pela coloquialidade dissertativa,
tornando a leitura palatável e prazerosa desde o primeiro momento. Mérito, sem
dúvida, da Maria José que soube “penetrar com denodo e carinho, os meandros
mais intricados da obra do nosso Milton”.
O
livro em questão é dividido em quatro partes ou eixos temáticos que versam
sobre a intertextualidade, a heteronímia, o processo de criação e os espectros
do Spleen encontrados no poeta Milton
Rezende, que já possui nove livros publicados e completa agora, em 2016, trinta
anos de estrada literária desde a publicação de “O Acaso das Manhãs”.
Repassemos
então, em breves pinceladas, os capítulos ou temas estudados, pois temos a
plena certeza que nenhum comentário substituirá a completa leitura do livro:
como nos filmes em que a sinopse deve servir para aguçar ainda mais a vontade de
ver todo o filme. Eu, Patrick Ariel, poeta inédito e estreante, ficaria
satisfeito se os eventuais leitores das redes sociais (que conseguiram chegar
até aqui) me acompanhassem até o final e fossem além, adquirindo um exemplar do
livro e através da leitura e apreciação pessoal, tirassem as suas próprias
ideias e conclusões.
Já
ressentimos muito, desde algum tempo, a morte ou a mordaça das análises
críticas nos órgãos de imprensa e a ausência daqueles grandes críticos
literários que dissecavam autores e obras em grossos compêndios. Nos tempos de
colégio achávamos aquilo maçante e hoje quantos de nós não daríamos tudo para
ter de volta os antigos suplementos com seus artigos teóricos.
No
primeiro capítulo a autora faz um apanhado geral sobre a intertextualidade em
seu contexto histórico e correlaciona-a, em particular, com seu objeto de
estudo, o poeta Milton Rezende e nos poemas em que ele adota tal procedimento
que, em se tratando da poética contemporânea é bastante comum e corriqueiro, assim
como o uso das epígrafes. A meu ver essa intertextualidade no autor estudado
enriquece sobremaneira os seus escritos sob uma perspectiva dialética em
paralelo com autores como Manuel Bandeira, Augusto dos Anjos e Drummond –
verdadeiros ícones em que o poeta se espelha, reverenciando e enriquecendo com
um olhar próprio e apropriado.
No
capítulo seguinte é dada ênfase no estudo da heteronímia e, com originalidade,
a autora Maria José nos revela um completo panorama deste recurso largamente
empregado no fazer poético do Milton. Demonstra que os heterônimos deste autor
dialogam com o próprio e entre si mesmos, o que, sem dúvida, é uma
particularidade bastante interessante em se tratando do uso de heterônimos, que
teve sua expressão máxima com o grande Fernando Pessoa. Aliás, a autora traça
esse paralelo entre o poeta português e o fazer poético do Rezende, misto de
funcionário público e celebridade rural escondido no anonimato das montanhas de
Minas.
Na
sequência vem uma análise da Maria José, engenheira da palavra e autora perspicaz
que agora se depara e se debruça sobre o processo de criação do poeta mineiro, dissecando,
discernindo e exemplificando com inúmeras poesias retiradas dos livros do autor,
formando desde já uma breve antologia de poemas estudados que poderá ser usada
como base para novos estudos, dela própria ou de outros aventureiros dispostos
a levar adiante a tarefa de retirar o Milton do limbo acadêmico e levá-lo à
apreciação de mais leitores.
No
último capítulo, a autora se dedica a rastrear os indícios ou resquícios do Spleen na obra do autor, como se fossem
espectros do romantismo ainda vivos e remanescentes na contemporaneidade dos
temas abordados, tais como o subjetivismo e a morte. Para tanto faz um apanhado
global da escola romântica vigente na segunda metade do século XIX e aborda
autores como Álvares de Azevedo e sua correlação com a lírica atual e
reinventada nas temáticas predominantes do poeta Milton Rezende.
Finalmente,
para fechar o livro, há um apêndice e um anexo formado por diversas entrevistas
com o próprio poeta (concedidas em diferentes períodos e contextos) e também com
alguns escritores e poetas amigos, conterrâneos e/ou conhecedores da obra do
autor de Ervália.
Dito
isso, acho que só nos resta ler o livro da Maria José e, através dele, dar um
passo e um impulso rumo à obra poética do Milton, descobrindo e desvendando
novas sendas de fruição, percepção e compreensão da gênese literária
empreendida por este “poeta de escrita tão refinada, familiar aos leitores da
poesia moderna, mas ao mesmo tempo estranha aos leitores da atual poesia
contemporânea”.
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